Diagnóstico Clínico

O diagnóstico clínico da Síndrome de Rett é fundamentado em critérios aplicados internacionalmente, os quais permitem identificar as formas clássica e atípica deste transtorno. Tais critérios vêm, ao longo de três décadas, sendo revisados com base em consensos.  

No seu estágio inicial, a Síndrome de Rett pode ter seu diagnóstico clínico dificultado, principalmente considerando que muitos médicos ainda não estão suficientemente familiarizados com essa condição. Desta forma, muitas pessoas afetadas pela Síndrome de Rett recebem um diagnóstico clínico equivocado, como o de Autismo Infantil, Paralisia Cerebral ou condições afins.

Os critérios mais recentes foram publicados no estudo intitulado Rett Syndrome: Revised Diagnostic Criteria and Nomenclature publicado em 2010, por Neul et al. (Annals of Neurology 2010; 68(6):944-50) e são, hoje, utilizados por pediatras, neuropediatras, psiquiatras e geneticistas, na definição do diagnóstico clínico.

Este consenso divide os critérios diagnósticos em critérios principais, critérios de suporte e critérios de exclusão. A utilização destes critérios permite descartar a hipótese de Rett ou confirmar o diagnóstico clínico de Síndrome de Rett típica (também chamada de Síndrome de Rett clássica) ou Síndrome de Rett atípica (também chamada de forma variante).

Os critérios são descritos abaixo, através da livre tradução do artigo Rett Syndrome: Revised Diagnostic Criteria and Nomenclature.


CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS PARA RETT – 2010


 

Considerar a presença de desaceleração pós-natal no crescimento cefálico como sinal sugestivo de SR.

» Anteriormente, a desaceleração do perímetro cefálico pós-natal era tida como critério diagnóstico de Rett. Entretanto, esta desaceleração do crescimento pós-natal no crescimento cefálico não deve mais ser considerada critério diagnóstico necessário, uma vez que não está presente em todas as pessoas com Rett. No entanto, esta desaceleração é uma caraterística importante para suspeita diagnóstica precoce e deve ser considerada um sinal sugestivo.

♦ Critérios principais:

  1. Perda parcial ou total de habilidades manuais funcionais já adquiridas
  2. Perda parcial ou total de linguagem falada já adquirida

» A avaliação de perda de linguagem falada adquirida deve se basear na melhor habilidade de fala já adquirida (não necessariamente na aquisição de diferentes palavras ou de habilidades de linguagem mais altas). Assim, se a criança aprende a balbuciar e perde essa habilidade, deve-se considerar perda de linguagem adquirida.

  1. Anormalidades na marcha: Marcha prejudicada (atáxica ou dispráxica) ou ausente.
  2. Movimentos manuais estereotipados, como automatismos de torcer/apertar as mãos, bater palmas ou bater uma mão na outra ou em alguma parte do corpo, levar a mão à boca, lavar/esfregar as mãos.

♦ Critérios de suporte para forma atípica de SR

  1. Distúrbios respiratórios em vigília
  2. Bruxismo em vigília
  3. Padrão de sono prejudicado
  4. Tono muscular anormal
  5. Distúrbios vasomotores periféricos
  6. Escoliose / cifose
  7. Retardo no crescimento
  8. Mãos e pés frios e pequenos
  9. Episódios inadequados de risadas / choro / gritos
  10. Resposta diminuída à dor
  11. Intensa comunicação pelo olhar (como “apontar com o olhar”)

» Muitas dessas características listadas acima são idade-dependentes e podem se manifestar e/ou se tornar mais evidentes em determinadas idades. Por isso, o diagnóstico de Rett atípica é mais fácil em crianças mais velhas do que em crianças menores. No caso de crianças com menos de 5 anos que apresentam regressão e dois ou mais critérios principais, mas não apresentam cinco critérios de suporte, pode-se fechar o diagnóstico de “SR provavelmente atípica” e essas crianças devem ser reavaliadas periodicamente para a revisão diagnóstica adequada à idade.


CRITÉRIOS DE EXCLUSÃO PARA SÍNDROME DE RETT TÍPICA


  1. Danos cerebrais secundários a: (a) traumatismo pré ou pós-natal, (b) doença metabólica, ou (c) infecção severa que cause problemas neurológicos

» Este critério se destina a cobrir qualquer outra causa primária de disfunção neurológica, excluindo a hipótese de SR. Deve haver evidência inequívoca de que a disfunção neurológica tenha de fato resultado do insulto (exame neurológico e/ou oftalmológico + ressonância e/ou tomografia computadorizada + exames complementares)

» Há relatos de indivíduos que apresentam todas as características clínicas de SR típica e mutações no gene MECP2, mas também têm causas potenciais de disfunção neurológica, como a trissomia do cromossomo 21. Esses casos não devem ser classificados como SR típica porque o diagnóstico de RTT típico se aplica ao início e ao curso de uma doença particular, que pode ser exacerbado por outras entidades etiológicas confusas. Em vez disso, eles devem ser considerados uma forma atípica de RTT se, de outra forma, atenderem aos critérios de consenso.

  1. Desenvolvimento psicomotor evidentemente anormal nos primeiros seis meses de vida.

» São atrasos bastante evidentes a ponto de não ocorrerem marcos normais (aquisição de controle de cabeça, deglutição e desenvolvimento do sorriso social)

» Hipotonia leve generalizada e outras alterações sutis do desenvolvimento previamente relatadas nos primeiros seis meses de vida são comuns na SR e não devem ser consideradas critérios de exclusão.

» Este critério reflete o reconhecimento de que indivíduos com SR Típica não apresentam desvios grosseiros no desenvolvimento esperado nos primeiros seis meses de vida. Embora tenha sido reconhecido que algumas alterações no desenvolvimento inicial podem estar presentes nesses indivíduos, normalmente a família e o pediatra não se preocupam com o desenvolvimento antes dos seis meses de vida. Isso contrasta com uma das formas atípicas de SR, denominada variante congênita, na qual o desenvolvimento é grosseiramente anormal desde o nascimento. Indivíduos que apresentam esse padrão de desenvolvimento devem, portanto, ser avaliados usando os critérios de RTT atípico e receber o diagnóstico de forma congênita de RTT atípica se preencherem esses critérios.


UTILIZAÇÃO DOS CRITÉRIOS PARA DIAGNÓSTICO CLÍNICO DE RETT


Forma típica ou clássica

Forma atípica ou variante

1. Obrigatória a presença de período de regressão seguido de melhora ou estabilização em ambas as formas de manifestação da SR

» Devido ao fato de mutações no MECP2 serem atualmente identificadas antes mesmo de qualquer evidência de regressão, deve-se considerar “possível” diagnóstico de SR no caso de crianças com menos de 3 anos de idade que não tenham apresentado qualquer perda de habilidades, mas que apresentem características clínica sugestivas de SR. Essas crianças devem ser reavaliadas a cada 6-12 meses para eventual evidência de regressão que, se observada, deve concluir o diagnóstico de SR. Se não for observada qualquer regressão até os 5 anos de idade, deve-se questionar a possibilidade de SR.

2. Obrigatória a presença de todos os quatro critérios principais e não enquadramento em nenhum dos critérios de exclusão

2. Obrigatória a presença de pelo menos dois dos quatro critérios principais

3. Não é necessária a presença de critérios de suporte, embora estejam frequentemente presentes na forma típica de SR

3. Obrigatória a presença de cinco dentre os onze critérios de suporte


FORMAS VARIANTES DA SÍNDROME DE RETT


Vários casos são descritos para três variantes específicas de Síndrome de Rett Atípica, apresentadas a seguir.

É importante observar que o diagnóstico de uma dessas variantes ainda requer os critérios estabelecidos para SR Atípica sejam atendidos.

 

Variante com

fala preservada

(Variante de Zapella)

Variante com

epilepsia precoce

(Variante de Hanefeld)

Variante

congênita

(Variante de Rolando)

Características

Clínicas

– Regressão aos 1-3 anos com fase de plateau prolongada

– Redução leve das habilidades manuais (uso das mãos mais preservado)

– Recuperação da fala após regressão (a recuperação da fala, com palavras ou frases, ocorre em torno dos 5 anos de idade)

– Deficiência intelectual mais leve (QI de até 50)

– Comportamentos autísticos são comuns

– Frequência reduzida de características de SR típica (ocorrência rara de epilepsia e disfunções autonômicas, escoliose e cifose leves, perímetro cefálico normal, peso e altura geralmente normais)

– Ocorrência precoce de crises epiléticas (as crises aparecem antes dos 5 meses de idade e antes do período de regressão, com presença de espasmos infantis, e epilepsia mioclônica refratária)

– Frequência reduzida de características de SR típica

– Desenvolvimento inicial evidentemente anormal (atraso psicomotor severo e inabilidade para andar)

– Microcefalia pós-natal severa, antes dos 4 meses de idade)

– Regressão nos primeiros 5 meses de vida

– Ausência de olhar intenso típico da SR

– Presença de anormalidades autonômicas típicas da SR (pés e mãos pequenos e frios, distúrbios vasomotores periféricos, distúrbios respiratórios em vigília)

– Anormalidades motoras específicas (estereotipias com a língua e movimentos bruscos dos membros)

Genética

Molecular

Mutações em MECP2 são encontradas na maioria dos casos

Mutações em MECP2 são raras.

Recomenda-se análise molecular para mutações em CDKL5

Mutações em MECP2 são raras.

Recomenda-se análise molecular para mutações em FOXG1

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